segunda-feira, 20 de maio de 2013

Projeto Leitura Cronológica: Dom Casmurro

MACHADO DE ASSIS, Joaquim Maria (1839-1908). Dom Casmurro. Porto Alegre, RS: L&PM, 2012.



Momento houve em que os olhos de Capitu fitaram o defunto, quais os da viúva, sem o pranto nem as palavras desta, mas grandes e abertos, como a vaga do mar lá fora, como se quisesse tragar também o nadador da manhã”. (pg 220-221)

Teria Capitu traído Bentinho? É essa a grande dúvida a que chegamos ao final de Dom Casmurro. Dúvida que o narrador, Bentinho, vai incutindo no leitor.

Bento Santigo, já um homem de meia idade, resolve escrever um livro de memórias. Narrando o namoro de adolescente com a vizinha de muro, Capitu, e seus planos para fugir do seminário (ao qual estava preso em virtude de uma promessa da mãe) até alcançar o altar.

Na segunda parte do livro, isto é, depois de já estar casado, o narrador vai semeando dúvidas quanto a fidelidade de sua amada Capitu. Encontros fortuitos de Capitu e Escobar, as maneiras do filho que se assemelham as do amigo, a relação de Dona Glória com Capitu e Ezequiel que se torna mais fria, os olhos que Capitu deitou no defunto Escobar...Mas ao mesmo tempo nos mostra outros elementos que absorvem Capitu. Sabemos desde os primeiros capítulos do ciúme cego de Bentinho (há um momento em que Bentinho fica cheio de ódio ao ver Capitu trocar alguns olhares com um rapaz que passa a cavalo na rua) e há também a causalidade de certas semelhanças. Bentinho conta em outro ponto que Capitu tem uma grande semelhança com a mãe de sua amiga Sancha. Poderia ser assim a semelhança de Ezequiel com Escobar, mera coincidência do acaso. Ainda há o fato de Bentinho citar muitas vezes a peça de Shakespeare, Otelo, onde Otelo acaba por matar a esposa inocente. Talvez isso fosse um indicio que também aqui a esposa não fosse culpada. De minha parte, acredito na inocência de Capitu. Acho que muitas das suspeitas de Bentinho são resultados de um ciúme exagerado. Ademais, tem o fato (apontado pela primeira vez por Helen Caldell - 1960, O Otelo brasileiro) de ser Bentinho o narrador da estória sendo apresentada apenas a sua visão particular dos acontecimentos.

Dom Casmurro é o mais famoso romance de Machado de Assis e considerado por muitos a sua obra prima. Dom Casmurro tem gerado algumas adaptações: a primeira é de 1968 e chama-se Capitu e é bem fiel ao livro. A segunda, Dom (2003) é uma adaptação contemporânea. E em 2008 em homenagem ao centenário de morte de Machado de Assis foi produzida uma serie para a televisão também nomeada Capitu. Recomendo!

terça-feira, 14 de maio de 2013

Projeto Leitura Cronológica: Quincas Borba


MACHADO DE ASSIS, Joaquim Maria (1839-1908)Quincas Borba. Porto Alegre, RS: L&PM, 2012.


"...Rubião tinha os olhos no Quincas Borba, que farejava impaciente, e que se atirou para ele logo que um moleque abriu a porta do cercado. Foi uma cena de delírio; o cachorro pagava as carícias do Rubião, latindo, pulando, beijando-lhe as mãos." (p. 70-71)

Antes de começar a comentar o enredo do livro, gostaria de ressaltar a nota de Machado de Assis feita à sua terceira edição onde ele diz que um amigo lhe sugeriu que  "Quincas Borba" seria uma continuação de "Memórias Póstumas de Brás Cubas" e pedia que Machado fizesse uma trilogia escrevendo um livro dedicado a persongagem Sofia. Machado diz que chegou a considerar a sugestão mas que depois declinou dela afirmando que tudo o que tinha para dizer sobre Sofia já estava dito no livro (Quincas Borba) e que escrever outro sobre ela seria "repeti-la". Esta nota - em tempos em que qualquer livro se transforma em uma série interminável de repetições - me soa bastante sábia.

Neste livro, reencontramos Quincas Borba, personagem que tem sua participação em Memórias Póstumas como amigo de Brás Cubas. Aqui, ele já está doente e aos cuidados do amigo, o ex-professor Rubião, e sempre ao lado de seu cão fiel a quem ele deu seu próprio nome, Quincas Borba. 

Quincas Borba morre no Rio de Janeiro já completamente louco com sua filosofia e deixa sua herança ao seu amigo Rubião com a condição de que este cuide de seu cachorro tal como se fosse ele. Em posse de sua recém adquirida fortuna Rubião deixa Barbacena e segue para o Rio de Janeiro. No trem conhece o casal Palha e Sofia que se encarrega de inseri-lo na corte. 

Rubião aos poucos apaixona-se por Sofia que mantém uma atitude ambígua com relação a ele ora atraindo ora repelindo suas investidas. E sendo o marido conivente com esta situação para tomar emprestimos de Rubião. Assim, nas mãos de seus "amigos" da corte: Palha, Sofia, Camacho, Freitas e tantos outros. Rubião acaba por esbajar sua fortuna e perder também o juízo restando apenas a solidão, a loucura e seu único e fiel amigo, o cão Quincas Borba.

Aqui pode até parecer que já se disse tudo sobre o livro, mas não se engane em pensar que qualquer livro do Machado de Assis não tem graça em ser lido porque já se sabe o que acontece no final. A "graça" de ler Machado de Assis não é saber o que acontece, mas como acontece. A sutileza, a ironia com que ele narra esses acontecimentos não têm preço. E por mais que se conheça de cor para onde caminha a estória sempre vale a pena só pelo prazer de se encontrar com a sua maravilhosa escrita.