Ler
Rachel de Queiroz sempre me traz a sensação de encontrar velhos conhecidos. O
lugar da minha infância, mesmo quando as personagens são tão diferentes de mim
parece que já ouvi falar daquele tipo em uma era remota. Talvez por isso sinta
tanta afeição pelas suas narrativas.
João
Miguel, personagem que dá título ao livro, é um homem comum que sob embriaguez
cometeu um crime. Um homicídio. E por causa deste ato de insensatez ébria acaba
preso. E a partir daí o cenário da narrativa é o cárcere. Um cárcere bem
peculiar, só possível no interior de uma cidadezinha nordestina dos anos 30,
onde os presos transitam com certa liberdade dentro das dependências da cadeia,
a exceção de João Miguel que ainda não foi para o sumário (ou seja, não foi
julgado e sentenciado) e permanece trancado.
Os
presos, “livres” na cadeia, mas aferrados ao compromisso resignado de cumprir
sua sentença, parecem submetidos a uma Lei moral ou apáticos demais para fugir.
Por exemplo, quando João Miguel, recém-chegado, questiona a outro preso, Zé
Milagreiro, o porquê de um terceiro preso não fugir visto que vive uma espécie de
regime semiaberto, Milagreiro responde: “Pra quê? Onde é que, fugindo, se
escondendo, ele podia viver melhor do que aqui? Só tem mesmo essa
obrigaçãozinha de vir dormir na cadeia”.
Em “João
Miguel” Rachel introduz uma breve discussão sobre o sistema penitenciário, sobre
sua validade e capacidade, ou não, de recuperação; discussão que me pareceu o
mais relevante deste livro. No entanto, as
personagens, apesar de aceitarem a pena resignadas, pareciam não sentir nenhum
remorso pelo assassinato cometido, o que me causou certo estranhamento.
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